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Registros antigos e a omissão dos apelidos de família

Na prática do registro civil verifica-se que os antigos assentos de nascimento indicavam apenas o prenome do registrado, sem fazer nenhuma alusão aos apelidos de família. Embora questionamentos surjam frequentemente, o fato é que não há nada de errado nesses registros.

Isso porque durante mais de trinta anos o registro civil de nascimento seguiu a regulamentação do Decreto nº 9.886/1888.

Tal diploma não exigia a menção aos apelidos (nome de família) do registrado, mas apenas ao prenome e eventualmente ao sobrenome – conceito à época diferente do atual.

Conforme disposto no art. 58 desse Decreto:

“Art. 58. O assento do nascimento deverá conter:

5º O nome e sobrenomes que forem ou houverem de ser postos a criança;
[…]
8º Os nomes, sobrenomes e appellidos dos pais”.

 

Ou seja, enquanto para o registrado apenas se exigia a menção ao nome e sobrenomes, para os pais se exigia também a indicação dos apelidos.

E, diferentemente do Código Civil vigente, que incorporou à lei o conceito comum de sobrenome no art. 16, na legislação antiga os nomes de família eram classificados como apelidos.

Nesse sentido, Miguel Maria de Serpa Lopes asseverou, em seu Tratado dos Registros Públicos, que:

“Entre nós, quer na lexiologia, quer na técnica legislativa, não existe harmonia, antes confusão, no denominar os vários elementos formadores de composição do nome.

[…]

Pretende Pereira Braga que nome e prenome servem para designar o primeiro nome individual; sobrenomes, seriam os outros nomes individuais; apelidos, os patronímicos ou nomes de família.

Posto em desacordo com a técnica legal, a classificação supra é aceitável, mesmo porque, dada a confusão reinante sobre o assunto, impossível encontrar critério mais esclarecedor e perfeito”. (Op. cit. 6. ed. rev. atual. volume I. Brasília Jurídica. p. 194/195).

 

Ou seja, o registro realizado na vigência do Decreto nº 9.886/1888 sem a indicação do apelido de família do registrado não apresenta nenhum erro ou omissão. Trata-se de caso de aplicação da regra tempus regit actum. Não há, por outro lado, nenhum óbice para que a anotação posterior de casamento ou óbito do registrado indique o nome completo constante do respectivo registro, facilitando com isso a identificação da pessoa natural constante do registro.

Cabe observar, por fim, que esse diploma legal foi posteriormente revogado pelo Decreto nº 18.542/1928, que entrou em vigor em 1º de maio de 1929, o qual instituiu nova disciplina sobre o assunto:

“Art. 68. O assento do nascimento deverá conter:
[…]

5º, o nome e o prenome, que forem postos á creança;

[…]

8º, os nomes e prenomes, a naturalidade, a profissão dos paes;

[…]

Art. 69. Quando o declarante não indicar o nome completo, o official lançará, adeante do prenome escolhido, o nome do pae e, na falta, o da mãe, si forem conhecidos e não o impedir a condição de illegitimidade, salvo reconhecimento no acto (arts. 73 e 74.)”

 

Dessa forma, caso o registro de nascimento tenha sido lavrado na vigência do Decreto nº 18.542/1928 e não indique o nome de família do registrado, pode-se cogitar da retificação desse erro funcional, na forma do art. 110 da Lei nº 6.015/1973.

 

reinaldovelloso

Tabelião, Mestre e Doutor em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo

One Comment

  1. Excelentes comentários. Eu estava precisando desses esclarecimentos e eles foram muito úteis para mim. Obrigada.

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