Necessidade de lei para reorganização das delegações

Na edição de hoje do Diário da Justiça Eletrônico do Estado de São Paulo foi publicado o Parecer nº 198/2016-E e a decisão do Corregedor Geral da Justiça do Estado que indeferiu requerimento feito por Tabeliães de Notas de diversos Municípios do Estado de São Paulo que, por força da Lei Complementar Estadual nº 1.274/2015, foram elevados à categoria de Comarca.

A decisão fez menção ao Processo nº 2011/00156131, da Corregedoria Geral da Justiça, o qual foi instaurado em decorrência da decisão do Colendo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.415, quando se firmou a tese de que a modificação das competências dos serviços notariais e de registro (criação, extinção, acumulação e desacumulação de unidades) depende de lei em sentido formal.

Cabe observar que, em São Paulo, o artigo 24, § 2º, nº 6, da Constituição do Estado, estabelece a competência exclusiva do Governador de Estado para a iniciativa de lei que disponha sobre criação, alteração ou supressão de cartórios notariais e de registro. E o artigo 17, § 1º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, preceitua que lei disporá sobre normas para criação, considerando-se os critérios de distribuição geográfica, densidade populacional e a demanda do serviço, bem como a fixação de prazo para a instalação dos cartórios criados e localização dos cartórios.

No entanto, o Procurador Geral da República propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.223 da norma estadual sob o fundamento de que a atribuição constitucional para a iniciativa de lei sobre o assunto seria privativa do Poder Judiciário.

Nesse contexto, é prudente se aguardar o desfecho da referida Ação Direta de Inconstitucionalidade e a definição da competência para propositura do projeto de lei dispondo sobre as regras para reorganização das delegações do Estado.

Ressalto que a legislação anterior à Constituição Federal de 1988 sobre a reorganização das delegações seguia critérios eminentemente políticos, assim como a criação de Distritos, Municípios e Comarcas.

Já a Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, estabeleceram novas bases, de cunho técnico e não político, para a organização dos serviços notariais e de registro, com a previsão de elaboração de planos de adequada e melhor prestação de serviços, observados os critérios populacionais e socioeconômicos, sem qualquer vinculação das circunscrições geográficas à organização judiciária, prevendo apenas a necessidade de um registrador civil em cada sede municipal, bem como a efetivação de algumas medidas apenas por ocasião da vacância. Além disso, conferiu direito de opção ao notário ou registrador nos casos de desmembramento ou desdobramento da serventia.

Nesse sentido pode-se mencionar:

Art. 1º Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.
[…]
Art. 26. Não são acumuláveis os serviços enumerados no art. 5º.
[…]
Art. 29. São direitos do notário e do registrador:
I – exercer opção, nos casos de desmembramento ou desdobramento de sua serventia;
[…]
Art. 38. O juízo competente zelará para que os serviços notariais e de registro sejam prestados com rapidez, qualidade satisfatória e de modo eficiente, podendo sugerir à autoridade competente a elaboração de planos de adequada e melhor prestação desses serviços, observados, também, critérios populacionais e sócio-econômicos, publicados regularmente pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
[…]
Art. 44. Verificada a absoluta impossibilidade de se prover, através de concurso público, a titularidade de serviço notarial ou de registro, por desinteresse ou inexistência de candidatos, o juízo competente proporá à autoridade competente a extinção do serviço e a anexação de suas atribuições ao serviço da mesma natureza mais próximo ou àquele localizado na sede do respectivo Município ou de Município contíguo.
§ 1º (Vetado).
§ 2º Em cada sede municipal haverá no mínimo um registrador civil das pessoas naturais.
§ 3º Nos municípios de significativa extensão territorial, a juízo do respectivo Estado, cada sede distrital disporá no mínimo de um registrador civil das pessoas naturais.
[…]
Art. 49. Quando da primeira vacância da titularidade de serviço notarial ou de registro, será procedida a desacumulação, nos termos do art. 26.
Art. 50. Em caso de vacância, os serviços notariais e de registro estatizados passarão automaticamente ao regime desta lei.
[…]
Art. 53. Nos Estados cujas organizações judiciárias, vigentes à época da publicação desta lei, assim previrem, continuam em vigor as determinações relativas à fixação da área territorial de atuação dos tabeliães de protesto de títulos, a quem os títulos serão distribuídos em obediência às respectivas zonas.
Parágrafo único. Quando da primeira vacância, aplicar-se-á à espécie o disposto no parágrafo único do art. 11.

 

Todas essas disposições indicam a complexidade do tema e apontam para a conveniência de se aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade da norma estadual. E, uma vez definida a autoridade competente para a propositura da lei sobre as regras para a reorganização das delegações, o tema deve ser objeto de um amplo debate com a participação das entidades representativas de classe e da sociedade civil, visando ao aprimoramento na prestação dos serviços notariais e de registro do Estado.

reinaldovelloso

Tabelião, Mestre e Doutor em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo